Mais de três décadas depois do movimento das Diretas Já, voltamos a testemunhar uma série de episódios de cerceamento da liberdade de expressão no campo da arte. Em 2017, o fechamento precoce da exposição QueerMuseu, no Santander Cultural, em Porto Alegre, e os ataques ao artista Wagner Schwartz por ocasião de sua performance La Bete, no 35º Panorama da Arte Brasileira, no MAM SP, motivaram a revista Jacaranda e a editora Cobogó a reunir artistas, pensadores e curadores para refletir sobre as formas de cerceamento como fenômeno global no livro Arte Censura Liberdade - Reflexões à luz do presente.
Agora, em 2021, com as ameaças à liberdade se tornando cada vez mais intensas e concretas no Brasil, a Cobogó, em parceria com plataforma Zait, vai reunir alguns dos autores desses textos para que, sob a luz dos acontecimentos na esfera política e cultural recente, atualizem os temas abordados naquele volume. O ciclo de debates Arte Censura Liberdade - Reflexões à luz de 2021.2, vai debater o papel das instituições, seus profissionais, políticas culturais, educacionais e condições de trabalho no setor artístico, acadêmico e cultural em a partir de cinco encontros on-line ao vivo entre 11 de novembro e 9 de dezembro
, sempre às quintas-feiras, das 17h às 19h.
No primeiro, em 11 de novembro, a crítica de arte, curadora independente e pesquisadora Luisa Duarte, organizadora do livro e mediadora dos encontros, vai apresentar o ciclo e passar a palavra a Daniela Labra, historiadora e crítica de arte, para comentar seu ensaio “O corpo nu, aquele estranho conhecido”, em que traçou um olhar retrospectivo sobre o nu na arte. “Exigir a censura de obras de arte nas quais figuram imagens desses corpos despidos é impedir o desenvolvimento do pensamento analítico, acreditando que o mal está na transparência da informação e na poesia, e não no deserto provocado pela ausência destas”, escreveu.
Na segunda palestra, em 18 de novembro, Frederico Coelho, pesquisador, escritor, curador e professor, retoma “Arte para quem? Arte para todos”, em que contrapôs as artes visuais a outras linguagens, como a música e a literatura, para pensar o seu (não) lugar no imaginário popular brasileiro. “Como reivindicar uma liberdade criativa e institucional, como conviver com um mercado de trabalho para poucos consumidores e, ao mesmo tempo, não ser parte orgânica daquilo que um cidadão comum lutaria para garantir sua existência? Em suma, como convencer a todos de que a liberdade individual da arte é a garantia de liberdade coletiva da vida?”, perguntou no texto.
Depois, no dia 25, será a vez da curadora, escritora e professora Clarissa Diniz revisitar “Tudo – ainda – está em seu lugar”, no qual frisou a importância de se problematizar a luta de classes circunscrita na chamada “guerra cultural” que habita o ataque ao território da arte contemporânea. Para ela, no artigo escrito a partir dos acontecimentos de 2017, “aceitar irrestritamente a ideia de uma ‘guerra cultural’ (claramente apropriada por grupos reacionários, como o tem feito Olavo de Carvalho) e planejar “contra-ataques” sem a devida problematização da luta de classes que a circunscreve – e que, por fim, faz estremecer nossa hegemonia – me parece um ato de conservadorismo e hostilidade”.
O primeiro encontro de dezembro, no dia 2, será com Marisa Flórido. No ensaio que irá comentar no debate, “Arte entre liberdade e servidão”, a professora, curadora e crítica independente abordou o fascismo como aquilo que alveja o poder de imaginar outros mundos possíveis, próprio da arte, afirmando que “arte é o que desperta no outro a potência de seus gestos, de dar forma e figura à nossa capacidade de mudar o mundo”.
Por fim, no dia 9 de dezembro, Moacir dos Anjos encerra o ciclo revendo suas “Notas sobre a miséria do olhar”, onde lembrou que essa certa “miséria do olhar” não é exclusiva dos conservadores, mas, sim, algo que pode afetar, também, aqueles que defendem o poder transformador da arte e que combatem e repelem os que a atacam. “Museus ou centros culturais que se curvam às demandas de censura à arte não estão à altura de sua mais essencial missão, que é cuidar do que pode a arte; que é cuidar do poder de a arte transformar a vida de quem se deixa afetar por ela”, afirmou no texto.
Dessa forma, a partir de diferentes perspectivas e uma multiplicidade de pontos de vista, a série de encontros Arte Censura Liberdade - Reflexões à luz de 2021.2 propõe um olhar para o pensamento crítico e a prática da arte e seu sistema hoje – ampliando e atualizando discussões que possam clarear nosso futuro. Saiba mais e inscreva-se na Zait.